terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Quem te viu e quem te vê

Agradeço ao amigo Reclamão pela dica. Vejam o que dizia José Genuino em 2000 antes de assumirem o poder, e as ações dele e do governo de seu partido.

O que falta ao PT e aos seus seguidores, além de ética, honestidade, caráter, vergonha na cara, etc. é coerência.

Fonte: http://gab.miltontemer.sites.uol.com.br/tribuna_debates/103.html
A corrupção e morte da cidadania
José Genoíno *
( Publicado no "Estado de S. Paulo" em 29 abr. 2000)
Na teoria republicana clássica sempre se teve como certo que a corrupção era a principal causa da decadência das repúblicas e de sua transformação em regimes tirânicos ou monárquicos. Nas democracias modernas, em nome ao combate à corrupção alguns regimes de força foram implantados. 

Hoje o problema não está no fato de a corrupção poder proporcionar o fim da democracia, mas na convivência que ela estabelece com a democracia. Uma democracia doente, porque a corrupção representa uma violação das relações de convivência civil, social, econômica e política, fundadas na eqüidade, na justiça, na transparência e na legalidade. Em suma, a corrupção fere de morte a cidadania. Num país tomado pela corrupção, como o Brasil, o cidadão se sente desmoralizado porque se sabe roubado e impotente. 

O cidadão sabe-se impotente porque não tem a quem recorrer. Descobre que os representantes traem a confiabilidade do seu voto, que as autoridades ou são corruptas ou omissas e indiferentes à corrupção, que os próprios políticos honestos são impotentes e que a estrutura do poder é inerentemente corruptora. Dessa impotência se firmam as noções de que "nada adianta" e de que no fundo "são todos iguais". A fixação desses sentimentos representa o fim da cidadania, pois ela se baseia na participação ativa do indivíduo na luta por direitos e na cobrança e fiscalização do poder. Quanto mais agonizante a cidadania, mais ativa se torna a corrupção. Nas condições da cidadania agonizante, o corrupto sente-se à vontade para se justificar e até para solicitar o aval eleitoral para continuar na vida política. 

Em 16/4, o "Estado de São Paulo" publicou entrevistas sobre a corrupção no País com os chefes dos três poderes - o presidente da República, o presidente da Câmara dos Deputados e o presidente do Supremo Tribunal Federal -. As entrevistas causaram espanto a muitas pessoas, pois são o retrato fiel da indiferença das autoridades pela corrupção. Os chefes dos poderes se limitaram a constatar a ineficiência das instituições e a declarar-se perplexos e enojados com tanta corrupção. Não é isso que se espera de quem tem o poder de agir e de acionar os instrumentos de combate aos corruptos. 

O poder no Brasil não só não age, mas protege os corruptos. Todos sabem que o problema da corrupção não se reduz apenas a uma escolha entre o honesto e o desonesto. A estrutura do poder público é corruptora. Em paralelo, a estrutura fiscalizadora - como o Banco Central, a Receita e a Polícia Federal e a esfera judicial e processual - favorece a impunidade, o que, na prática, se traduz em proteção, mesmo que involuntária, da corrupção. Mas se a corrupção, sua proteção e a impunidade se tornaram estruturais, a verdade é também que, em última instância, há uma vontade explícita de manter intacta a estrutura corruptora

Essa vontade se manifesta de várias formas. A principal é a falta de iniciativa das autoridades constituídas. Outra ocorre pelo bloqueio das mudanças institucionais e legais que visam a ampliar e aperfeiçoar os instrumentos de combate à corrupção. Veja-se que no Congresso se tentou aprovar o fim da imunidade parlamentar para crimes comuns, a limitação do sigilo bancário e fiscal para detentores de cargos públicos, medidas de combate à elisão e à sonegação fiscal, medidas de combate à evasão ilegal e à lavagem de dinheiro, envolvendo até mesmo as famosas contas CC-5, mudanças moralizadoras da Lei Eleitoral, etc. Essas medidas foram sistematicamente derrotadas pela maioria governista, com o apoio de chefes dos poderes superiores. Em contrapartida, a Câmara aprovou o princípio que consagra o nepotismo; a Lei da Mordaça, que dificulta a investigação judicial; ampliou-se o foro especial para julgamento de autoridades e transferiu-se para foro especial o julgamento de delitos previstos na lei de improbidade administrativa, tornando-a ineficaz. Já o comando do Poder Judiciário não pode limitar-se a constatar o anacronismo do Código de Processo Civil e Criminal. Precisa propor sua reforma. 

Hoje a sociedade já percebeu que a corrupção estrutural está albergada na falta de vontade de mudar e de punir e na vontade explícita de proteger. A racionalidade do cidadão não consegue compreender o porquê e o como de o processo de impeachment, o escândalo do Orçamento, a falência dos Bancos Nacional e Econômico, o desvio milionário do TRT de São Paulo, a corrupção da Prefeitura da capital paulista e de tantos outros casos de corrupção não resultarem em nenhuma prisão dos principais envolvidos. E porque a razão não consegue compreender essa medonha impunidade, o cidadão sente-se desmoralizado. A corrupção assume a condição de normalidade da vida política do País. A degradação e a ineficiência do poder público atingiram tão elevado grau que não se pode mais acreditar que, apesar de lentas, as mudanças virão. 

Chegamos a um ponto em que somente uma profunda cirurgia cívico-política pode conferir ao Brasil condições democráticas e éticas de convívio social, econômico e político.

José Genoíno é deputado federal (PT-SP)

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